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Produtos biológicos na defesa da agricultura

Uma das características que seres vivos têm é a capacidade de interagir com o meio e reagir a ele. Quando se trata das culturas no campo, elas naturalmente interagem com fatores abióticos (a: sem; bio: vida) como sol, chuva e vento, mas também com fatores bióticos - ou seja, com outros seres vivos. Algumas destas interações são benéficas, mas muitas podem ser prejudiciais, como quando pragas infestam uma cultura. 

Ao longo da evolução da agricultura o homem desenvolveu diferentes ferramentas para controlar as pragas que oneram a produtividade. Entre as muitas que hoje existem está o uso de seres vivos que são inimigos naturais dessas pragas indesejadas e que podem atuar como defensivos agrícolas. A essa prática é dado o nome de controle biológico, uma área que já passa por sua quarta revolução e que está se solidificando no Brasil.

 O primeiro relato da prática de controle biológico de pragas data do século IV na China, quando formigas eram utilizadas para controlar a presença de outros insetos. Mas ao longo do tempo a adoção deste tipo de controle se disseminou pelo mundo e passou a usar muitos outros organismos. Muitas espécies de joaninha, por exemplo, são conhecidas como predadores benéficos tanto em seu estágio de larva quanto de adulto, alimentando-se de ácaros, percevejos e outros pequenos insetos e seus ovos. Já as larvas da pequena vespa da espécie Trichogramma galloi têm como hospedeiro o embrião da broca do colmo (Diatrea saccharalis), um importante inseto praga da cana-de-açúcar. Contudo, insetos e outros organismos macroscópicos não são os personagens mais comuns do controle biológico no nosso país.

Microrganismos, como bactérias, vírus, protozoários e alguns fungos, vêm interagindo naturalmente com plantas há milhões de anos em relações tanto positivas, como no caso de bactérias que ajudam plantas a fixarem nitrogênio da atmosfera, quanto negativas, no caso de bactérias causadoras de doenças. Com o melhor entendimento sobre como isolar esses pequenos seres vivos e sobre sua biologia, passou-se a entender como muitos deles podem ser valiosos auxiliares no controle de pragas.

Talvez o exemplo mais clássico do uso de microrganismos para a proteção das plantas de interesse agronômico seja o da bactéria Bacillus thuringiensis (Bt), descoberta no início do século XX. Ela naturalmente produz proteínas letais para insetos e, a partir da década de 1920, diferentes variantes dessa bactéria passaram a ser utilizadas em formulações que podiam ser aplicadas sobre as culturas para um combate relativamente específico de insetos praga. Mais recentemente, técnicas de biologia molecular permitiram que os genes responsáveis pela produção das proteínas inseticidas fossem introduzidos em plantas para que elas mesmas as produzissem. Apesar de fugir do âmbito do controle biológico propriamente dito, esse foi um importante avanço biotecnológico que, além de seguro, vem trazendo enormes benefícios para a agricultura há mais de 20 anos.

Atualmente, um caso que merece destaque é o dos fungos que pertencem ao gênero Trichoderma. Produtos formulados com base nesses microrganismos são os mais aplicados no Brasil, cobrindo hoje uma área superior a cinco milhões de hectares. Presentes em praticamente todos os tipos de solo, esses fungos são capazes de controlar muitos outros fungos causadores de doenças em plantas, além de ajudarem a promover o crescimento de raízes e da planta como um todo.

Apesar de sua ainda baixa representatividade no mercado brasileiro de defensivos (US$ 90 milhões em um total de US$ 6 bilhões anuais, ou 1,5%), o controle biológico está em alta e vem ganhando força, tendo mostrado um crescimento entre 16% e 20% ao ano no país e podendo atingir a marca de uso de 15 milhões de hectares neste ano. Com efeito, a proporção de produtos biológicos registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) em relação ao total de defensivos saltou de 7% em 2010 para 60% em 2016.

Mesmo sendo uma prática milenar, o controle biológico vem ganhando cada vez mais espaço no campo. Avanços tecnológicos têm permitido um melhor entendimento e uso inteligente das relações entre as muitas espécies relevantes para a garantia da produtividade das culturas de interesse. É o caso do uso de algoritmos que explicam essas relações através de modelagens matemáticas, do sequenciamento dos genes dos diversos novos microrganismos benéficos que são identificados nos solos todos os dias, ou mesmo de formas mais modernas de aplicação das formulações desses microrganismos na lavoura, como o uso de drones.

E é dessa maneira, promovendo a interação entre o antigo e o novo, e reafirmando a importância da convergência de áreas, que o controle biológico vem se estabelecendo como um componente valioso da agricultura de hoje e do futuro.

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